Gerard Butler (Leónidas) e Rodrigo Santoro (Xerxes) em 300
Escolhi duas imagens, que são do filme 300, para servir um propósito: o de que um olhar não isento pode sempre distorcer o que vê ou, no mínimo, subverter o contexto e a mensagem a seu bel-prazer. Fui ao cinema sem grandes expectativas ― fiquei curioso com o que li sobre a banda-desenhada de Frank Miller, a qual foi adaptada ao filme, e sobre o facto de representar um passo (muito) à frente na digitalização e na computorização ao serviço da sétima arte (nem precisamos de óculos especiais para que as personagens saltem do ecrã como se fossem a três dimensões). Descansem. Não me vou aventurar no campo pantanoso da crítica, que há quem o faça com mais propriedade do que eu, mas não dei por mal empregue o tempo que gastei. Não será um grande filme, longe disso, mas vê-se bem.
Voltemos às imagens aqui postadas. Tenho ouvido por ai dizer que este filme possui, inequivocamente, um olhar gay. Quem já me leu antes, sabe que sou um pouco ― um pouco não, muito ― avesso a esse tipo de generalizações, pela simples razão de que não é por estar a deixar aflorar a minha (bi/homo)sexualidade que vou passar a enxergar com olhos de gay tudo o que me rodeia. Quem viu o filme, e olha para estas fotografias, que não são manipuladas (uma delas é, mas só por razões técnicas), pode, todavia, fazer esta leitura legítima: o duelo entre o viril Leónidas, rei dos Espartanos (interpretado pelo escocês Gerard Butler) e o ambíguo Xerxes (interpretado pelo brasileiro Rodrigo Santoro) ― sexualmente falando, pois mesmo com três metros de altura e um corpo trabalhado, há na sua imagem algo de deliberadamente feminino ― não é só bélico, há também ali uma tensão sexual (ilustrada na perfeição na cena acima).
No fundo, tenho para mim que Xerxes, mais do que derrotar Leónidas, queria seduzi-lo e trazê-lo para o seu lado, invertendo o papel tradicional em que o mais feminino se subjuga ao mais masculino. Ao mesmo tempo que inveja Leónidas, Xerxes deseja-o e só admite aniquilá-lo quando o outro não aceita submeter-se à sua vontade (desejo). Isto não está claro no filme, mas pode ser interpretado desta forma por quem assim o quiser entender.

Do mesmo modo, os que detectam no filme um forte conteúdo homoerótico, vão dizer que a grande maioria dos actores masculinos (pouquíssimas mulheres na trama, mas a rainha é belíssima), ou pelo menos aqueles em quem a câmara mais se demora, não foi escolhida à toa, mas sim a dedo para não fazer feio ― o que até faz sentido se tivermos em conta que os mesmos passam o filme inteiro semi-nus. Depois há também aquela coisa da camaradagem entre militares, que os gays gostam sempre (e muitas vezes com uma certa razão, admito) de perverter ― muito suspeitas certas praxes militares, muito duvidosas mesmo, mas passemos adiante que não estou aqui para falar disso…
Não sei se, por esta altura, já terei ou não desenvolvido uma sensibilidade gay ― bom, isto admitindo que existe, de facto, uma… ―, mas notei como curioso o facto de, mesmo tendo identificado a carga homoerótica do filme, não ter ficado em momento algum excitado com este ou aquele actor. Pode até ser que seja uma ideia pré-concebida minha, ou seja partir do princípio que os gays sempre ficam alterados quando vêem homens desejáveis. Se calhar, as coisas nem funcionam assim. Uma coisa sei, o meu não desejo não tem nada a ver com ainda estar amarrado àquela máxima bacoca de que um homem “de verdade” não sabe apreciar outro homem. Mesmo quando sempre me assumi como hetero nunca tive problemas em dizer se acho um homem bonito ou feio ― e nessa lógica, é claro que não fico indiferente, por exemplo, ao actor Gerard Butler, que acho, na boa, um homem bonito ―, mas, constatei é que o meu olhar ainda é mais de inveja do que de desejo.
Quero dizer: olho para alguns daqueles homens e não é desejo de possui-los (ou de ser possuído por eles, se quiserem) o que sinto, mas sim uma certa inveja dos seus corpos, da sua beleza. Uma inveja relativa, entenda-se; primeiro porque gosto de corpos definidos e enxutos mas não tipo armário como é o caso da maioria no filme (com músculos muito pronunciados), segundo porque mesmo estando muito longe de ser um Deus grego, também não sou nenhum estafermo (lol).
E já que os rapazes dão o corpo ao manifesto, não pude deixar de reparar noutra coisa: a ausência de pêlos (excepção feita às barbas e fartas cabeleiras). Quem conhece um pouco da história das várias civilizações, saberá por certo que a moda de eliminar os pêlos corporais não é uma coisa de agora. Inclusive nos homens. Imagino que os metrossexuais de plantão, conhecidos por serem partidários da depilação total ou parcial da pilosidade corporal, também se revejam neste filme. A estética dominante no filme é a de que os pêlos não fazem ali falta nenhuma.
Confesso que não tenho uma opinião formada sobre a depilação. Pelo menos não em relação à minha pessoa. Dou graças à genética por não ter saído um Tony Ramos, o que de facto não me agradaria de todo, pelo que me sinto feliz de não ter praticamente pêlos nas costas, no pescoço ou até mesmo nas nádegas (enfim, talvez vocês não precisem de saber tanto… exagerei na informação! Menos). Tenho pêlos nas pernas, nas axilas, nos braços, mas não me incomodam. A minha barba é cerrada e viveria bem sem ela, mas como me posso dar ao luxo de não me barbear todos os dias ― para desespero da minha mãe, que acha sempre, quando me vê com uma barba de três ou mais dias, que pareço, passo a citar, “um salteador de estradas”! ― não é por ai.
A minha dúvida é em relação aos pêlos do peito e aos púbicos. Passo a explicar. Gosto de ver pêlos no peito a quem os tem uniformes, o meu problema é que os meus, além de não serem em grande quantidade, também me parecem sempre irregulares e indomáveis. Já os raspei mais de uma vez, mas nunca me decidi a avançar para a depilação periódica. No fundo, fico balançado entre a falta de paciência necessária a uma manutenção desse género e o facto de achar que não tenho um torso suficientemente definido (acho, outro preconceito meu, que um peito liso pede um torso definido).
Há uns tempos, li um artigo na revista Wallpaper* (querem revista mais metrossexual?) sobre uma técnica que está a fazer furor nos salões de beleza masculinos, uma tal de manscaping, e que consiste em eliminar selectivamente os pêlos masculinos. Por outras palavras, os homens eliminam os pêlos que têm em excesso (ou por completo) em certas áreas e “domam” os que ficam, o que pode passar por os pentear com gel, dar-lhes uma coloração diferente ou, inclusive, criar manchas de pêlos com formas mais harmoniosas. Vejam o exemplo que vinha na revista:

No que toca aos pêlos púbicos, a coisa pia mais fino. Associo sempre a imagem de homens sem pêlos púbicos aos actores porno. No meu caso, está fora de questão. Gosto de ver pêlos acima do pau, mas os tomates (saco) a descoberto. É uma preferência pessoal. Já me aventurei nalgumas experiências, mas, uma vez mais, esbarrei na preguiça e, digamos, numa certa falta de técnica. E fico por aqui, que isto é um blogue em tom confessional, mas também não convém abusar.
Na mesma edição da Wallpaper, li ainda que as famosas irmãs brasileiras JSisters ― que colocaram as nova-iorquinas a depilarem-se como as brasileiras, no estilo minimal brazilian bikini wax ― perceberam que os homens também estavam abertos a dar uma arejada no andar de baixo e, vai daí, criaram a depilação brazilian sunga wax. Na gíria da moda, a mesma também ficou conhecida como BSC, ou seja Back (costas), Sac (escroto) e Crack (rego do rabo, a expressão é feia, mas não me ocorre outra agora, sorry).
Paneleirice (viadagem) ou não, a mim, chamem-me antiquado, o que me incomoda mesmo é visualizar a cena. Não sou um pudico, mas entregar assim de ânimo leve as partes mais recônditas do meu ser nas mãos de um(a) estranho(a), não me parece lá muito boa ideia. Além de que deve doer como o ca-ra-lho! Todos nós temos os nossos limites.
Desafio os meus amigos bloggers a manifestarem-se. Dêem a vossa opinião. Com pêlo, sem pêlo, o que preferem? E faz ou não diferença na hora da verdade?
Vou encerrar este post com a certeza de que me estiquei um pouco ― lá cai por terra a minha fama de intelectual (lol).
Sinto-me como aquela personagem da série Will and Grace, um recém-gay com imagem de sapo que Will e Jack se encarregam de transformar em príncipe, e que, depois de muitos falhanços, leva ao delírio os seus mestres quando, finalmente, comete três princípios sacrossantos que nenhum gay que se preza menospreza: querer ter um corpo acima das suas reais possibilidades, gastar mais do que deve numa peça de roupa e suportar sacrifício físico em nome da beleza. Bom, neste post já invejei os corpos dos actores de 300; de certeza que já gastei (e não só uma vez…) mais do que devia em roupa; quanto a sacrifícios, lembro-me agora de umas botas Prada que, há uns anos, comprei em saldos ― uma delas apertava-me o pé, mas aguentei estoicamente mais de um mês até ela se moldar, tudo porque as achava o máximo!
E depois desta tirada, que me faz corar de vergonha, retiro-me de fininho…