Encosta-te a mim, nós já vivemos cem mil anos
encosta-te a mim, talvez eu esteja a exagerar
encosta-te a mim, dá cabo dos teus desenganos
não queiras ver quem eu não sou, deixa-me chegar
Chegado da guerra, fiz tudo p´ra sobreviver
em nome da terra, no fundo p´ra te merecer
recebe-me bem, não desencantes os meus passos
faz de mim o teu herói, não quero adormecer
Tudo o que eu vi, estou a partilhar contigo
o que não vivi, hei-de inventar contigo
sei que não sei, às vezes entender o teu olhar
mas quero-te bem, encosta-te a mim
(Encosta-te a Mim, por Jorge Palma, escutar aqui)
Gosto de ser original, mas não me importo mesmo nada, neste caso, de ser só mais um entre os que estão rendidos à mais nova música de Jorge Palma, Encosta-te a Mim, que faz parte do álbum Voo Nocturno. Eu diria que é quase impossível ficar indiferente à letra, mas cada um sabe de si. Só sei que, ao visionar o clipe, reproduzido neste post graças ao abençoado Youtube, fui sendo invadido por uma onda de nostalgia. Mas nostalgia das boas, daquelas que dão gosto sentir.
Por ali passa muita gente, de artistas a músicos, que fez parte da minha mais tenra juventude e ao som de quem vivi (e vivo) tanta coisa digna de ser recordada. Foi quase inevitável lembrar-me daquele apartamento no Saldanha (centro de Lisboa), onde vivia um colega meu da universidade, mesmo por cima da casa do Jorge Palma. Vira e mexe, organizávamos ali jantaradas que descambavam ao mesmo ritmo vertiginoso com que esvaziávamos as garrafas de vinho… Numa delas, particularmente surreal, lembro-me que, num dado momento, alguém se debruçou na janela da cozinha e nem o ar condicionado do Jorge Palma escapou ao amargo de boca de um fim de festa atribulado… Seja como for, nunca constou que tivesse reclamado… Não fosse Palma, himself, um “ganda” maluco! Bons tempos aqueles… hehehehehe!
Ainda no clipe, revejo também Xana (brasileiros, nada de interpretações maldosas, Xana é só mesmo o diminutivo/apelido de Alexandra, tá?), aquela que será sempre para mim a vocalista dos Rádio Macau, uma banda de referência dos meus “anos loucos”. Era comum encontrarmos a Xana na Rua Luís de Camões, onde ela então vivia com o Zé Pedro dos Xutos & Pontapés, e onde nós íamos lanchar nos intervalos das aulas. Achávamos que éramos íntimos, heheheheheh. Melhor mesmo foi um concerto… Sei que não foi em Lisboa, mas lembro-me de que eu e o meu melhor amigo na altura ― deixámo-lo de ser um pouco antes do seu inesperado divórcio e de ter decidido “fugir” de Portugal…― fizemos questão de gritar pela “Xana” o tempo todo…Só tinha graça para nós, pois até ela, a “miúda das nossas vidas” (que eu preferi manter, até hoje aliás, só como amiga para não perder a amizade dele, que chegou a ser seu marido…), envergonhada, fez de conta que não nos conhecia durante todo o tempo em que estivemos naquele disparate… eheheheheheh!
E já que abri a “sessão nostalgia”, nem de propósito, fui jantar na passada sexta com uma amiga, que já não via há uns bons meses, a um dos meus bairros de eleição em Lisboa. Dei-me conta que frequento há quase 20 anos o Bairro Alto, porque é ali, independentemente de modas, que as minhas noites têm outro sabor. Até posso passar temporadas sem lá ir, mas volto. Sempre volto. Apesar da noite abafada de Verão, daquelas que hoje já vão sendo raras, resolvi enfiar-me nuns jeans pretos da Levi’s ― recuperei-os do armário, quase novos, e podem ser agora considerados uma peça vintage, já que a marca não fabrica mais aquele modelo naquela cor ― e numa camisa também preta, esgargalada, que comecei a namorar na Osklen do Chiado, mas que só vim a comprar numa passagem fugaz por Salvador. Faltou-me a coragem para esborratar os olhos de negro ― à la Billie Joe Armstrong, vocalista do Green Day, ou à la Brian Molko, vocalista dos Placebo ― para ficar com o visual completo de um vocalista punk-glam-rock, mas acho que a barba de dois dias foi suficiente para que, a cada esquina e perante o olhar cúmplice da minha acompanhante, fosse interpelado por tipos diferentes que, quase em surdina, me perguntavam se queria “hax” (haxixe/maconha). Há coisas que não mudam, pensei. Hoje, como ontem, até um “menino da mamã” pode fingir-se “bad boy” por uma noite. Acabámos a noite a conversar muito, sentados numa mesa posta na calçada, às vezes alheios, às vezes atentos a quem passava. E como é divertido ficar a ver quem passa no Bairro Alto. Tudo isto entre um desfiar de memórias, planos para o futuro próximo, boas gargalhadas, umas garfadas de polvo à galega, duas porções de queijo de cabra panado com compota de morango (uma delícia!) e copos, muitos copos, de sangria branca bem gelada. Afinal, como alguém já disse um dia, a vida também é feita destes pequenos nadas.