4.5.07

Roupa a lavar


If it makes you happy, it can’t be that bad!
(Sherly Crow)


Decido que estou a precisar de uma camisa branca mais informal. Vou à loja Pepe Jeans no Saldanha, no centro de Lisboa. Não me consigo decidir por uns modelos que acho demasiado justos no corpo (ler demasiado “abichanados” para meu gosto), mas logo dois empregados solícitos, um rapaz e uma rapariga (moça, ok?), decidem vir em meu socorro. É claro que querem ganhar a cobiçada comissão, mas noto ali um certo frisson no seu comportamento, confirmado mais tarde através de risinhos nervosos e de um ou outro comentário que intercepto entre os dois. Estou a agradar ao menino e à menina, e isso, por sua vez, agrada-me também ― afinal, sou um tipo comum que passa despercebido na multidão. Resolvo ser simpático. A ele deixo-o espreitar no provador enquanto estou a experimentar as camisas. A ela, quando estou a pagar, respondo à sua provocação quando me pergunta se o que trago pendurado ao pescoço é um MP3. Estendo-lhe um auscultador e deixo-a ouvir Ute Lemper. Desconfio que ela não sabe quem é, mas não faz mal. Saio de lá com uma camisa nova e com o ego afagado.

Entro no comboio (já vos disse que adoro andar de comboio/trem?) e procuro um lugar junto à janela. Estão todos tomados, pelo que escolho um ao lado de um rapaz jovem. Ainda antes de me sentar, ele vira-se. Aquele rosto é-me familiar. Já o vi antes. È um miúdo comparado comigo (não tenho tesão por miúdos muito mais novos do que eu, antes que se apressem a tirar conclusões), mas, como da outra vez em que o notei, não deixo de reparar que é bonito, com um ar tímido que me diverte. Também eu já fui (e ainda sou, até certo ponto) um miúdo tímido. Ele olha para mim de lado e eu retribuo o olhar (uma coisa muito soft, ok?, que não ando por ai a dar bandeira). Estamos os dois de auscultadores nos ouvidos. Quando sente o meu olhar, ele cora imediatamente e desvia a sua atenção para a janela. Fica assim até sair.

As voltas que a vida dá. Há uns bons anos, teria eu mais ou menos a idade dele, estudava em França e, num certo dia, um tipo estranho (nada a ver comigo, que tenho bom ar…lol) sentou-se ao meu lado no autocarro (ônibus). A dada altura, além de me lançar uns olhares esgazeados, começou a apertar-me contra a janela. Não tinha por onde me mexer, mas estava tão assarapantado que nem reagi (ah, se fosse hoje…). Felizmente, a minha paragem não tardou e sai apressado. Não sem antes ele se levantar para me deixar passar e me mirar da cabeça aos pés. Desci e segui até a um supermercado onde fazia compras. Pelo caminho, tive a sensação de que estava a ser seguido, mas não ousei olhar para trás. Entrei no supermercado, mas quando andava no meio dos corredores, vi a figura sinistra a olhar para um lado e para outro qual barata tonta. Tive a certeza, naquele instante, que andava à minha procura. Meti-me na fila para pagar. Acho que devia estar com suores frios. Por fim, ele avistou-me e chegou de mansinho. Estava hirto que nem um carapau. Como era o último da fila, ele teve a vida facilitada: encostou a cabeça ao meu ouvido e perguntou-me se queria ir beber um café com ele… Tinha 22 anos, sair ou dormir com homens estava fora do meu horizonte, e só consegui balbuciar um sumido: Je ne crois pas (não creio)... O homem evaporou-se tão rápido como apareceu. Eu acho que ainda fiquei a tremer uns bons minutos, perante o olhar incrédulo da senhora que estava à minha frente.

Enfim, lembrei-me da estória, mas é claro que não tem nada a ver com que se passou agora. Apenas gostei, confesso, de fazer o rapazinho corar. E revi-me nele, de certa forma.

Há por ai um mundo de possibilidades. Sinto-o. Mas é claro que insisto em manter-me encantado com um gajo que não sabe o que quer. Não anda nem desanda. Diz sim, mas é um sim frouxo, em cima do muro, a meio caminho para lado nenhum. Custa tanto assim dizer não? E se é sim que quer dizer, por que não assume e se deixa de merdas… Quem lhe deu já duas oportunidades, não lhe vai dar a terceira. Cansei. Vá para o Diabo que o carregue. E, já agora, eu também por ser um idiota e por continuar a escolher sempre os caminhos mais longos e tortuosos.

Bom fim-de-semana!

12 comentários:

BlueBob disse...

Oz,
Também aconteceu comigo algo parecido qdo era mais jovem. E como você, também tremi da cabeça aos pés com o convite que ouvi. Ah se fosse hoje!!

Bom fim de semana amigo!

Bjs

Anónimo disse...

Igual, igual! Só que comigo outro dia reencontrei o tiozão com a esposa e fui eu que o "persegui" e o botei pra tremer. Foi divertido! :-)

Agora... me dá aí o e-mail desse que "não goza nem sai de cima" que eu vou ter uma palavrinha com ele! As, se vou!

Anónimo disse...


Querido, quando eu digo que confundo-me contigo, não estou a dizer que entendo-te ou que passamos ou passaremos pelas mesmas coisas. Apenas senti brevemente o valor do seu questionamento. Eu te vejo como um menino que assiste tranquilo a chegada de uma tempestade, com uma curiosidade inexpressiva.

É direito de cada um escolher o que quer pra si mesmo, sabendo-se que nem tudo que é bom nos fara bem, ou que nem tudo que é mau nos fará mal. É tudo uma questão de escolha, se é que nos percebemos delas.

Não sei se vc já percebeu, mas eu falo muito de mim mesmo. Não sei entender os outros, sei perceber a mim mesmo perante os outros e dessa percepção exteriorizar um pensamento mais ou menos coerente.

Digo que só espero que não tortures o teu coração, pq é o que não desejo pra ninguém, e sei que muitas vezes nós não percebemos o quanto fazemos mal a nós mesmos.

Não analise nada do que digo de um ponto de vista gay ou hetero, isso é bobagem, pois todos nós choramos, todos nós sangramos; no fim os sentimentos ainda são os mesmos.

Abraços

"Há um limitado valor no conhecimento que advém da experiência, pois o conhecimento necessita de um modelo e o modelo é vario pra cada momento. A única sabedoria válida é a dá humildade".
T. S. Eliot, East Coker.

Aequillibrium disse...

=)

Will disse...

A mim aconteceu-me uma história semelhante quando eu tinha 16 anos, mas foi numa paragem de autocarro...

Râzi disse...

Rapaz, adoro sua narrativa!
:D

Bem, eu já vivi umas coisas doidas também, de me fazer suar, foi antes do Lê! Agora eu suo em casa mesmo! Hauaauhauhauhauah!

E tente indecisa é um pé no saco... mas quando a gente gosta, não tem jeito! Já te contei que eu corri 4 meses atrás do Lê, sem que ele me quisesse, e agora estamos há quase 3 anos juntos?

Se gostar mesmo dele, e nem que seja ao longe, conseguir vislumbrar uma oportunidade, invista!!!

Beijão!

Dawson disse...

Oi Oz!

Essas paqueras pelas ruas da vida são mesmo muito engraçadas. Dia desses eu estava dentro do ônibus e um rapaz estava do lado de fora, esperando o dele. A troca de olhares foi tão intensa, que perguntei o telefone, na cara-de-pau (através de leitura labial). Ele tentou me dizer, mas não consegui anotar e ele se foi, pois o ônibus dele veio... rs

Quanto ao rapaz que não se decide, quem sabe ele não resolve sair de cima do muro e vocês se entendem de uma vez...

Abraços!!!

DE CORPO E ALMA disse...

Cada vez gosto mais de ler as tuas histórias. Gosto da forma como escreves. Muito bom mesmo. Se for da mesma forma que encantas os rapazes e raparigas na rua, não me importava nada de cruzar contigo no comboio. Esquece estou a brincar, mas a verdade é que gosto do que escreves e como escreves.

Anónimo disse...

é engraçado que quando leio teu blog, eu imagino ele com sutaque hahaha, muito legal. Rpz acho que todos temos essas histórias aí, como vc diz, um tipo estranho sentou ao meu lado no autobus que eu vi que a intenção dele era outra (que medo), mas tudo bem, essas coisas aconteciam, eu achava tudo engraçado, mas é complicado, tbm não tinha a mente preparada para essas coisas hehe :)

Unknown disse...

Amigooooooooooooooo! Blz? Então, vc tá podendo, hein? Disputado pelos vendedores? Rsssssss...
Mas, afinal, quem te interessou mais?
BEijos!

Superfunky disse...

LOL hilariante a cena do hipermercado... eu tb tenho umas historias engraçadas, mas nunca as pus no meu blog lolol

Pralaya disse...

Penso que histórias destas já aconteceu a muita gente. Enfim são partidas que a vida nos prega :)